Conselho Tutelar de Três de Maio registrou 193 atendimentos por abandono escolar em 2022

Casos de faltas frequentes de alunos com idade entre 4 e 18 anos incompletos devem ser comunicados ao Conselho Tutelar para que o retorno à escola aconteça no menor espaço de tempo possível. Pais ou responsáveis são notificados e recebem orientações, advertência e é aplicado Termo de Responsabilidade

Conselho Tutelar de Três de Maio registrou 193 atendimentos por abandono escolar em 2022
Em 2022, foram 193 atendimentos entre FICAI e Busca Ativa nas escolas municipais e estaduais de Três de Maio. No primeiro semestre de 2023 já são 37, número considerado alto, se considerado o fim da pandemia

Em 2021 pelo menos um em cada dez estudantes do Ensino Médio em escolas públicas do Rio Grande do Sul abandonou os bancos escolares ao longo do ano. A taxa de abandono – baseada no Censo Escolar realizado pelo Instituto de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) –, aponta que o percentual de evasão escolar do Estado – de 10,7%, naquele ano, era quase o dobro da média nacional, de 5,6%. 

A evasão escolar amplifica desigualdades sociais e impacta negativamente a economia brasileira, revela a pesquisa “Combate à evasão no Ensino Médio: desafios e oportunidades”, do sistema Firjan Sesi, em parceria com o PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento). 

O estudo traça um amplo painel de dados e mostra que meio milhão de jovens acima de 16 anos abandonam a escola a cada ano. O problema é mais grave quanto mais vulnerável for a população: só 46% da camada social um quinto mais pobre conclui o Ensino Básico. Entre os estudantes do um quinto mais rico, este percentual chega a 94%.
 

Número de FICAIs e Busca Ativa preocupa Colegiado do Conselho Tutelar

No Rio Grande do Sul, uma importante aliada no combate à evasão escolar é a FICAI – Ficha de Comunicação de Aluno Infrequente. Ela deve ser preenchida nos casos de faltas frequentes de alunos entre quatro e 18 anos incompletos, buscando o seu retorno à escola no menor espaço de tempo possível. 

O levantamento aponta os motivos da evasão, situação de cada escola e possibilita desenvolver ações para fazer com que os alunos retornem. A ficha é aberta pela escola após cinco faltas consecutivas ou 20% de ausências no mês. Caso a escola tenha êxito no retorno do aluno, ela é encerrada pela própria escola. Caso contrário, é encaminhada ao Conselho Tutelar. Se ainda assim o aluno não retornar, a ficha é encaminhada ao Ministério Público. 

Segundo a coordenadora do Conselho Tutelar de Três de Maio, Neusa Terezinha Welter durante o ano de 2020, 2021 e 2022, devido à pandemia da Covid-19, as escolas municipais não aderiram ao sistema de FICAI tendo sido implantado a Busca Ativa. “A Busca Ativa eram relatórios enviados pelas escolas municipais para a Secretaria Municipal de Educação e, posteriormente, ao Conselho Tutelar para medidas protetivas adequadas a cada situação. Já as escolas estaduais mantiveram o sistema FICAI ativo durante todo o período”, explicou. 

Segundo informações apuradas pelo Semanal, junto ao Colegiado do Conselho Tutelar de Três de Maio, o ano com maior número de FICAI e Buscas Ativas foi 2022, considerando as redes municipal e estadual (não tendo nenhum registro das escolas da rede particular). “No primeiro semestre foram 67, enquanto no segundo semestre, 126, totalizando, 193 atendimentos entre FICAI e Busca Ativa”, revela a coordenadora. 

Já no primeiro semestre de 2023, conforme a conselheira Neusa, o sistema FICAI passou a ser novamente incluído na rede municipal.  E desde então, já foram emitidas 37 FICAIs. “É um número ainda preocupante em se tratando de um período pós-pandemia”, avalia a coordenadora.

Neusa explica que diante da emissão da ficha, os responsáveis são notificados e recebem orientações, advertência e é aplicado o Termo de Responsabilidade. “Após o atendimento a maioria retorna de forma efetiva para as escolas. Os casos que não retornam são encaminhados ao Ministério Público, sendo que alguns resultam em ação judicial onde os pais ou responsáveis são responsabilizados, podendo ser aplicada multa de três a vinte salários mínimos, conforme decisão/ determinação Judicial”, altera.

Conforme Neusa, dentre as argumentações e justificativas para a evasão escolar, muitos pais revelam que neste momento pós-pandemia os adolescentes estão desmotivados pelo fato de ter tido a experiência de aula a distância, de forma online, e a dificuldade de voltar à socialização. Também a falta de comprometimento e responsabilidade de alguns pais em encaminhar os filhos para a escola.

 

SAIBA MAIS SOBRE A FICAI

A FICAI - Ficha de Comunicação de Aluno Infrequente, foi instituída, em 1997, em Porto Alegre, através de parceria entre o Ministério Público, a Secretaria Estadual de Educação, a Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre e Conselhos Tutelares, com o objetivo de estabelecer o controle da infrequência e do abandono escolar de crianças e adolescentes.

Em 2011, a FICAI foi atualizada e feitas novas parcerias, com a Federação das Associações dos Municípios (FAMURS), Conselho Estadual de Educação (CEED), União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME), União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (UNCME), Conselho Estadual de Assistência Social (CEAS), Associação dos Conselheiros Tutelares do RS (ACONTURS) e Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente (CEDICA).

Desde 2012, a Ficha tem um sistema informatizado, que visa dar maior agilidade nos encaminhamentos. O acompanhamento do sistema pela web, através dos órgãos envolvidos, aumenta a probabilidade do retorno do aluno à escola. Através dos dados da FICAI Online, é possível ao Poder Público a construção de políticas públicas em prol da garantia do direito à educação.

 

Uso excessivo de celular contribui para o abandono escolar 

Questionado se entre as alegações dos pais para o filho não estar indo à escola porque prefere ficar em casa na frente do computador ou fazendo uso do celular, o Colegiado do Conselho Tutelar revela que esta situação ocorre e influencia no abandono da sala de aula. “Temos registros de casos de estudantes que ficam até tarde da noite em frente às telas, principalmente acessando jogos online. A orientação é de que os pais retirem o aparelho pois é de sua responsabilidade, tanto o aparelho quanto o filho; este fato prejudica o desenvolvimento da criança ou adolescente, assim como a organização familiar”, orienta.

Além disto, os conselheiros tutelares alertam aos pais para que observem o que seus filhos estão acessando na internet e, especialmente, para que não delegem a educação dos filhos para influenciadores digitais, como youtubers e tiktokers. “Infelizmente é uma realidade da atualidade”, lamentam, dizendo que embora saibam dessa situação, até o momento nenhuma família trouxe essa informação para os atendimentos. 

Pais devem limitar o uso do celular dos filhos e observar o que eles estão acessando na internet. E principalmente, não delegar a educação dos filhos para influenciadores digitais, como youtubers e tiktokers

 

Pais devem acompanhar as atividades e o rendimento escolar dos filhos

De acordo com Neusa, sempre que chega um pedido de verificação, o órgão orienta aos pais sobre a responsabilidade de acompanhar as atividades e rendimento escolar dos filhos, auxiliando nas tarefas, além de se fazerem presentes na escola. “Mas sabemos que algumas famílias são relapsas e embora sejam orientadas, advertidas e assinem Termo de Responsabilidade; na prática isso não acontece, sendo de responsabilidade da família a conduta”, ressalta a coordenadora. 

Aos pais, quando os filhos não estão frequentando a escola, o Colegiado orienta. “É preciso o retorno imediato, para que o aluno não tenha mais prejuízo com a ausência e com a falta de acompanhamento das atividades escolares. Os pais ou responsáveis também devem procurar a escola junto com os filhos para que sejam regularizados os conteúdos disponibilizados pelos professores para que o prejuízo seja o menor possível para o aluno”, conclui.

 

Realidade diferente em escolas privadas

Enquanto isso, na rede privada, as taxas de abandono se mantiveram quase nulas, a exemplo de Três de Maio, em que não houve registro de FICAI nas escolas da rede particular. 

Em nível nacional, o índice mais acentuado dos últimos 10 anos foi em 2020, quando 2% das crianças do Ensino Fundamental não concluíram o ano letivo. Nos demais anos e no Ensino Médio das escolas particulares do RS, o percentual máximo de evasão foi de 0,5%. A diferença entre as taxas da rede privada e da pública evidenciam uma desigualdade educacional.